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21/07/15

Viver


Começa nos braços e muito devagar, desce
É uma dor que avança, penetra e mexe
Não há como fugir e depressa sobe
Não tem nada de belo, não tem nada de nobre


É a dor do silêncio de quem desistiu
Uma coisa fechada que nunca mais abriu
É a vontade de virar costas e começar a descer
É a certeza crua de não poder permanecer


São os olhos cansados de quem se perdeu
Na luz de um corpo que nunca acendeu
É a dor, é a dor que vem de mansinho
A chorar o amor, mendigar um carinho


Nada se move nas vidas que se arrastam
Tudo se enche das coisas que se afastam
E de repente o grito do que já não sou
Que ressoa dentro do que não te dou


É a vida a esvair-se em largos tragos
A boca cerrada, os olhos alagados
Num mar de desespero e da tua solidão
É nunca mais a tua mão na minha mão


Começa nos braços e muito devagar, altera
Ao percorrer o corpo abre uma cratera
Onde cabe tudo o que eu podia ser
E onde não me resta nada senão morrer


Mas de repente a palavra aparece, escrita
Não é doce nem terna, nem sequer é bonita
A palavra lembra-nos que escolhemos a sorte
E que p'ra viver é preciso lembrar a palavra morte


A palavra lembra que respirar é preciso
Que podemos ajudar a construir um abrigo
Que apesar da ceifa e apesar do perigo
Podemos sempre ganhar um amigo...