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02/11/12

Nascemos na Paragem


Nascemos na paragem
Entre o que transporta e o que é transportado
Entre a miragem do que inicia a dor e a dor do acabado
Sentados e juntos nascemos na margem

Nascemos na paragem do futuro incerto
Dos minutos contados fizemos o tempo
E o tempo passava a nascer na paragem
Sentados e juntos nascemos na margem

Nascemos na paragem ou à margem de um mar
Que vai do Ser ao saber, e vai do ter ao guardar
Barco à vela ou autocarro que não sabe navegar
E sentados nesta margem tudo se há-de passar

Pois sentados na paragem logo depois de nascer
Viu-se a lágrima no homem, viu-se o que não pode ser
Estava ele e estava ela na paragem do saber
Viu-se adultos já cansados acabados de nascer

E sentados na paragem do movimento do som
Fez-se um filme colorido que a preto e branco se viu
Escreveu-se um livro em prosa que em poesia saiu
Dizem que se amavam muito mas nunca ninguém sentiu

Nascemos na paragem e lá temos de voltar
Tapa os ouvidos ao mundo não há nada pra contar
São migalhas, cardos, fados, prosas, tardes ao luar
Que sentados, juntos na margem
Nós vamos reinventar.



 julho 2012



01/11/12

Não basta

Não basta apenas ser o corpo que te pertence
Não basta querer-te desta vez e sem pensar
Não basta ser a alma e o coração
Não basta amar...

Se a vida fosse só uma forma de morrer
Se a morte fosse tudo o que temos a receber
Se te bastasse o que sentes, o que sou
Não me porias onde sei que estou.

Há dias que começam no final
e outros que terminam no principio
Há conversas que nunca foram tidas
saudades que nunca foram vividas
Há uma Lua no solstício de Verão
um Sol que não pára de chover
Há um beijo que nunca vou esquecer
um carro que desce a rua devagar
Há uma doida vontade de ficar
e a urgência de saber o que é real
Há a calma de quem quer perceber
Há também qualquer coisa de fatal

Se te bastasse eu ser o que sou
Se me bastasse ter o que não tenho
Se nos bastasse simplesmente amar
Se nos bastasse este amor tamanho

Mas não basta apenas ser feita à tua medida
Não basta a saudade e a solidão e a dor
que mesmo em cima de um grande amor
Não basta para evitar a despedida







16/10/12

Há coisas que se contam muito devagar
Pelos dedos da mão
Como quem vem abraçar
Um tempo sem perdão

Porque o tempo é como a vida
Não perdoa nem aguarda
Segue o caminho das coisas
Das coisas que agente larga

E as coisas que agente larga
Se são coisas que agente sente
Fazem dor no coração
Como se o cortassem rente

E quando se corta uma coisa
Mesmo sem querer cortar
A vida e o tempo juntam-se
com vontade de chorar

Mas a vida não tem olhos
E o tempo só anda em frente
Não há lágrimas que cheguem
P'ra aquilo que agente sente

As coisas que se contam muito devagar
Sabemos que mudaram
Quando as paramos de contar




26/09/12



ouvir a chuva lá fora
traz-me sempre cá para dentro de mim uma sensação de impaciência
é como se a nostalgia se instalasse aqui
e se sentasse, invisível, numa cadeira, ao meu lado

ouvir a chuva lá fora
faz-me lembrar botas de borracha com olhinhos
que tinha e adorava, quando era pequena
e lembra-me quando pisava as poças de água como se fossem proibídas
e eram...

ouvir a chuva lá fora
arrepia-me a alma com leveza
a leveza de quem a ouve em silencio e espera
espera que venha o sol ou a primavera

apetece parar
apetece fechar os olhos e tentar ouvir
para lá das gotas a cair
para lá do tempo a passar
apetece esperar

ouvir a chuva lá fora
faz-me lembrar um futuro que ainda não passou
faz-me lembrar um passado que nunca aconteceu
faz-me lembrar que o presente... ás vezes é envenenado

faz lembrar talvez
um qualquer universo paralelo
onde tudo anda de pernas para o ar
onde parar é andar e andar é parar
onde querer é poder
e poder é avançar
e correr é talvez algo, que lá, se faz muito devagar

ouvir a chuva lá fora
dá-me ao coração alento

o mesmo não acontece
se com a chuva vem o vento....

24/09/12

As vezes escolhes caminhos que pensas que sabes percorrer
Caminhos que pensas que te levarão em frente
Nem sempre os caminhos são aquilo que desejamos
E raramente o mais fácil é o mais acertado.

As vezes não escolhes caminhos e pensas que escolheste
Outras vezes sentas-te e esperas que o caminho se estenda à tua frente
E as vezes o caminho tarda tanto, que quando se estende a tua frente já mudaste de rumo.

As vezes deixas de querer seguir um certo caminho
E outras vezes, por mais que o queiras seguir
Ele está sempre a desaparecer sob os teus pés, normalmente cansados.

As vezes os caminhos percorridos em conjunto tornam-se mais divertidos e significantes
Porque um caminho partilhado é normalmente um bom caminho
E outras vezes, ainda, deixas alguém no caminho
Ou és deixado no caminho por alguém.

Quer vás para a frente ou para trás, um caminho é sempre um caminho.

Nunca andes por caminhos demasiado escuros ou obscuros
Nem vás por caminhos com luz a mais
Os caminhos radicais costumam dar mau resultado

Seja como for, nos caminhos que foram percorridos por mim
Deixei sempre, como toda a gente, uma ou outra marca.
Há agora um caminho debaixo dos meus pés...
Curiosa para ver onde vai dar, porque cheira a alfazema e a rosmaninho
Receosa por saber demais, no que toca a caminhos percorridos.

Perguntam-me se vou em frente
Respondo -É claro que sim
Um caminho passado é sempre alvo do receio futuro
Mas o futuro é sempre tão incerto...

O bom do caminho novo é a incerteza de onde irás parar
E a esperança que podes carregar enquanto caminhas

O Amor já é outra história e não tem nada a ver com caminhos...



19/09/12


Parabéns 

Quando nasci - estavas lá e viste-me nascer
Quando tive medo na escola - estavas lá e protegeste-me
Quando eu não queria comer e escondia a comida nos bolsos - estavas lá e ajudavas-me a ver-me livre das provas
Quando eu queria ficar debaixo da tua mesa do colégio a dormir - estavas lá e escondeste-me da professora
Quando morreu o meu animal de estimação - estavas lá e explicaste-me o céu
Quando tive o meu primeiro desgosto de amor - estavas lá e choramos juntas
Quando superei uma prova importante - estavas lá e festejamos juntas
Quando voltei de uma viagem dificil - estavas lá
Quando casei - estavas lá
Quando fui mãe pela primeira vez - estavas ao meu lado a ver o bebe sair e o que nos rimos juntas
Quando tive dificuldades - estavas lá e apoiaste-me
Quando te contei segredos - estavas lá e contaste os teus 
Quando fizemos grandes jantares e noitadas - estavas lá e voltamos sempre juntas para casa
Quando quando quando... estavas sempre lá para mim! (e eu para ti)

Pode haver muito boas irmãs no mundo - mas tu és a MELHOR QUE EU PODIA TER!!!
♥ AMO-TE ... nini

12/09/12

Aninhada a um canto da cadeira 

onde te leio, tusso

releio e penso - Sou?

penso se quero se não quero

penso - Serei?

e se eu não fosse eu, quem eu seria?

e depois e repenso e penso

- se todos queremos o mesmo

era o mesmo que eu quereria....


Aninhada a um canto da cadeira

Estou

21/06/12

Saudade, com letras

A saudade não é paRa todos
é talvez só para aqueles
que admitem que sentem
quando Um dia mentem
para fazer alguém feliz

A saudade é só para aqueles
que Inebriados de vida
sentem as pedras do chão 
como um beco sem saída

A saudade e o desprezo
de longe, são bem parecidos
É a dor e a ausência
a falta de amor de presença

Num há esperança noutro não
e nos dois há um sofrimento
que nasce debaixo dos pés 
e morre no coração

A saudade não é para todos
e nem poderia ser
é preciso ter corAgem para uM dia decidir
As Saudades que eu vOu ter.




08/05/12

Viver Viver


Ao cair da tarde

Levantei um manto

Olhei o relógio

Desatei num pranto


 

Deixei uma onda

Crispada no mar

Deixei-te sozinho

A falar a falar


Subi um rochedo

Cortei uma mão

Meu muso, amigo

Amor, meu irmão


Abrimos a porta

Tentamos entrar

Fechamos o livro

A calar a calar

 

Dançámos a noite

Brindámos o dia

E fomos ao norte

Que volta tardia



Subimos a escada

Duma moradia

De onde não saímos

Onde não entrámos


Olhei-te nos olhos

Abriste a alma

Beijei-te por dentro

Deixaste-me calma

 

Sabemos de cor

A canção do Ser

E juntos sentimos

Viver Viver



07/05/12

Eu eu eu eu

A dor que trago hoje
Tentei nomeá-la
E não consigo
Tem qualquer coisa de pó de garganta
E enche de vazio todo o peito
Uma dor que só de si já faz doer
Uma dor sem principio nem fim – como Deus
Uma dor sem meio, uma dor sem jeito

Para onde quer que torne o olhar, tudo me dói
Neste quarto olho os colares coloridos
Pendurados no espelho
E os colares parecem-me tristes e angustiados
São colares de ontem, do tempo que passa
São colares que nunca mais usei
Um a um todos perderam a graça

E no chão do quarto por cima das tábuas
Estão estendidos tapetes que nunca mais pisei
E no tecto falso que me olha altivo
Está o candeeiro que não vou acender
E nas paredes do quarto que me parecem vazias
Estão os quadros todos que eu não queria ter

Esta é uma dor daquelas que não tem nome
Daquelas que nos devora enquanto come
Daquelas que embala para dormir
É uma dor que não tem casa nem tem mesa
É uma dor de quem não tem a certeza
Uma dor de quem não tem como cair

É uma dor como quando temos uma torneira a pingar
Primeiro parece que não há problema
Um dia percebemos que nos estamos a afogar
E era só ter fechado a torneira
Ter mudado a braçadeira
Ter travado a brincadeira
Ter mudado de banheira
Ter parado com a conversa
Que não leva a nenhum lado
A não ser aquele sitio onde as pessoas se afogam
Em palavras e em águas
Águas mornas e paradas
De quem pensa que a razão é o que nos vai salvar
Quando toda a gente sabe que palavra é ternura
E que a água, muito usada, torna-se sempre tão dura


É uma corda que se enrola devagar na cintura
E vai subindo e apertando até chegar ao pescoço
É a angústia que não nos deixa chorar
É a tristeza de te querer abraçar
É o fosso, é o fosso
É a ponte e é o rio
É o vinho e é o pão
É sempre a dizermos que sim
É sempre a dizermos que não

Esta dor que hoje trago
Não a consigo nomear
Vem depois das descarriladas palavras
Que me atingem de frente e de lado
Que nos doem, nos afogam
mas parece sempre tão urgente falar
Num aparelho frio, que desliga
Que depois de se calar e nos calar
É só um aparelho preto, frio e cru
E fica ali sozinho a olhar-nos e acusa-nos
tu tu tu tu



27/04/12

26 Abril

Quando se ama alguém que perdeu a capacidade de nos amar a meio caminho
Morre-se para sempre, e todos os dias, um pouco sozinho

Quando se tem nas mãos o sangue, da morte do amor, que se tem
Deviam cozer-nos a boca e os olhos para não dizermos mais nada e nunca mais chorar

Quando se tem amor por quem nos tem grande apreço e amizade
Tornamo-nos metade de algo, ao qual falta metade

Quando se descobre que afinal as cores do arco-íris são todas preto e branco
Sentimo-nos enganados pela vida que nos fez acreditar nas cores todas de repente
E depois veio uma a uma retirar devagarinho o que pensámos nosso

Foi quando percebi que me amavas, que te perdi
Foi quando percebeste que me desfazia por dentro enquanto me amavas
Que me perdeste
Demos as mãos nesse dia e juramos o mesmo amor
Sem saber que nas tuas ele morria, e nesse dia nas minhas renascia

E foi também nesse momento que te amei mais do que nunca
Antes a dúvida era amor e amor era dor
antes pensava ser - o que sou agora, afinal
mas agora ..

Agora, ama-se muito alguém que diz ter perdido a capacidade de nos amar
E ser esse mesmo amor que eu matei em ti
E que a rastejar, dorido, forte e sozinho se veio alojar em mim, é quase demasiadamente pouco

Quando se ama alguém que não nos ama de volta, é como se o peito se enchesse de balões de ar quente que rebentam… rebentam simplesmente e magoam

E quando sabemos que éramos amados e estragamos isso com todo o peso de uma solidão anunciada
E a solidão veio apenas porque pensámos isso…

Quando se ama alguém que não nos pode amar de volta as coisas deixam de fazer sentido
Porque no amor há coisas que se fazem
Que sem amor não são possíveis de fazer de forma bela
Quando se ama alguém que não nos pode mais amar de volta - é meio amor

E o amor é das poucas coisas que o facto de ser metade o anula
Não há meio amor
Como não há meias mesas e meias cadeiras
Como não há meias vontades de ir à casa de banho
Não há simplesmente meio amor

Quando se ama alguém que não nos ama de volta e perdeu essa capacidade
Somos meia cadeira e meia mesa
Somos meia vontade de chorar
Somos meios feios meio bonitos
Somos a incapacidade para amar

(escrito ao som de)